Veneza uma viagem através dos sentidos
De volta da Itália, nesta manhã lendo uma entrevista com a pesquisadora britânica Jackie Higgins sobre seu livro Sentient, percebi o quanto nossos sentidos estão envolvidos, produzem e reverberam nossas vivências nestes eventos. Jackie sustenta a ideia de termos 12 sentidos (e não somente 5, como apreendemos na escola) e ainda aponta que outros especialistas defendem que temos mais de 30.
Uma segunda entrevista lida recentemente, sobre formação e retenção de memória, me faz concluir porque experiências como os recém visitados Salone del Mobile e La Biennale 2024 são tão eficientes para formação de nossas referências, repertório, opinião e criatividade. Mas o quanto nos fazem agir? Fico aqui elucubrando se quem sabe a memória também possa ser adicionada à nossa lista de sentidos….E se o incomodo que ela pode causar nos capacita a mudar. Mas vamos aos fatos:
Veneza, estamos in loco já alguns dias antes da abertura oficial da 60ª Bienal de Arte. A oportunidade de participar das cerimônias e festas de inauguração do pavilhão brasileiro, além de visitas guiadas à outros pavilhões e eventos paralelos me apraz. A cidade, rica desde sua formação e politicamente influente, sempre abrigou movimentos artísticos importantes. Porto de localização e comércio estratégicos vem recebendo ao longo dos séculos culturas e povos. Centenas de ilhas, canais e pontes e a sucessão de palácios num espaço pedonal é um estímulo contínuo. Estar na Itália ainda acresce indiscriminadamente música, gastronomia design e moda ao itinerário. Prestigiar a Bienal em Veneza: Luxo para todos os sentidos!
Foreigners Everywhere o tema da 60ª Bienal de Veneza
Neste ano o tema “Foreigners Everywhere” Estrageiros em todos os lugares (em tradução livre), um tanto árido e extremamente necessário, me trouxe uma constante reflexão: Enquanto nos vermos como cidadãos de um ou outro país e nos rotularmos nesta divisão e nas inúmeras que dela variam, e não a expandirmos da nacionalidade para Humanidade, e de países para Planeta, teremos muitos pontos de divergência. Isto é ruim? Não quando pensamos amplamente, pois somos diversos e múltiplos, mas sim toda vez que não aceitamos ou simplesmente não respeitamos o diferente e não nos reconhecemos como iguais.
Assim a inédita curadoria brasileira de Adriano Pedrosa, produz um passeio por numerosas questões de identidade, local, pertencimento, gênero, origem, colonialismo, limites, fronteiras, migração, classes, guerras, resiliência, disputas, meio ambiente, recursos, sustentabilidade, natureza, cultura, rotina, ancestralidade, legado, respeito, solidariedade. Um sem fim de representações de pontos e teses que um dia talvez, se ainda estivermos aqui, não precisaremos mais defender e explanar. Só vivenciar.
Por todos, em qualquer lugar
Assim como fitamos as misteriosas máscaras de carnaval, apreciamos vidros torcidos multicores de Murano; examinamos pormenores de Tiziano e Tintoretto à coleção Peggy Gugenheim. A cidade é lúdica, onírica, um deleite para os sentidos. Veneza sonha e permite sonhar, talvez como nenhuma outra cidade. Sem dúvida comporta expandir nossos sentidos e memórias, mas além de vislumbrar como realmente permite multiplicá-los para tecermos laços mais fraternos?
Estamos num ponto que é preciso ir além da arte e permitir que a vida se entrelace mudo afora repercutindo igualdade e equidade, respeitando a diversidade e celebrando as diferenças. Por todos em qualquer lugar!
Dica de Visitação
A 60ª Bienal de Arte de Veneza pode ser visitada até 24/11/2024, além de uma série de eventos paralelos por toda a cidade.
O pavilhão Brasileiro Ka’a Pûera dá vida à nossa história de resistência combinando cartuchos disparados e maracas. O confronto de processos coloniais amplifica a voz de Kaapora, uma entidade espiritual que zela por nossa relação com o planeta.
A exposição é realizada no ano em que um dos mantos é devolvido da Europa ao Brasil, onde estava desde 1699, atualizando questões pendentes desde o início da colonização.